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Ivanildo Nunes – o poder da criação artesanal

Nascido em Parnaíba, no Piauí, Ivanildo Nunes iniciou sua carreira ainda crian- ça. Fazia brincos, colares e pulseiras com arame, conchas da praia e miçangas. Ven- dia na calçada onde ficava o comércio do seu pai. Sempre gostou de produzir manualmente. Em 1985, inspirado pela novela Tititi, vestia bo- necas para sua mãe vender. E assim, nasceu um artesão nato.

Aos 17 anos, abriu sua empresa de moda praia, onde foi estilista, empresário e costureiro por algum tempo. Após 15 anos, o designer perdeu tudo e voltou para o Maranhão, onde assumiu a presidência da CDL . “Em parceria com o Se- brae fiz a primeira coleção autoral com tecidos tecnológicos e crochê de fibra de buriti e des- filei na Feira do Empreendedor em São Luís” – conta Ivanildo.

Mas o trabalho elaborado com toda dedicação traz uma história de superação e valorização do artesanato raiz, que mais tarde se transfor- ma em alta-costura. Ivanildo Nunes uniu o em- preendedorismo à moda, um casamento per- feito que gerou bons resultados. Nasciam aí os vestidos luxuosos para alavancar a carreira do designer.

Em 2006, Ivanildo Nunes foi convidado para participar do maior evento de moda autoral da América Latina: o Dragão Fashion Brasil, con- curso dos novos talentos que dá oportunidades a jovens que estão ingressando no mundo da moda, que abriu várias outras portas e traba- lhos para o designer, como: eventos de moda na (FENIT), Feira Nacional da Indústria Têxtil, através do Sinditêxtil.

ivanildo nunes

Dessa forma, Ivanildo Nunes conquistou a ca- deia produtiva da moda, ganhando espaço no setor da alta-costura por ter seu trabalho arte- sanal reconhecido.

A GRIFE IVANILDO NUNES

A marca hoje é conhecida por preservar toda a ancestralidade. Ivanildo Nunes traz, em todas as suas criações, elementos de diversos tipos de rendas artesanais, principalmente a renda de bilros, o Richelieu, o crochê, o bordado entre outras, todas trançadas pelas mãos de diversas artesãs das comunidades do interior do Ceará, que são tão valorizadas pelo designer.

ENTREVISTA

R.A – Qual a sua avaliação com referência ao mercado do vestuário (produção autoral), que tem crescido nesses últimos anos. A valorização desse trabalho magnífico tem reconhecimento?

IVANILDO NUNES: – Na verdade, nós que tra- balhamos com o mercado de moda autoral e que estamos desenvolvendo aos poucos essa consci- ência do que seja autoral, uma peça é uma peça que é feita sob medida. É uma peça que tem algu- mas referências da alta costura francesa. No meu caso, principalmente, que trabalho com artesa- nato, com várias técnicas manuais para poder construir uma renda exclusiva, e poder costurar um vestido exclusivo.

O mercado ainda não consegue entender esses conceitos, então acaba que as pessoas acham muito cara a peça, quando na verdade elas não representam nem 5% do que é cobrado lá fora. Ou seja, aquela mesma peça que seria cobrada fora do Brasil, no mercado Europeu. Mas é uma

questão de cultura mesmo. Então as pessoas não conseguem entender, e a gente vem batalhando aos poucos para mostrar todos os processos. Re- almente, é uma peça que demanda energia, não é uma peça produzida em série, é uma peça úni- ca. Então as pessoas precisam entender o valor desse trabalho.

R.A – Em todos os segmentos, observamos a tal da adversidade. Como você lida com essa ad- versidade na produção da moda “autoral” em nosso mercado e em outros mercados que você costuma trabalhar?

IVANILDO NUNES: – Como eu falei na per- gunta anterior, é difícil trabalhar moda auto- ral em um país onde não existe essa consciência da produção, de como é feita uma peça autoral, como ela é pensada. Isso faz com que a gente se movimente em direção a outros mercados. No meu caso, a gente tem o objetivo de internacio- nalizar a nossa marca.

Já desfilamos em Paris (2019) e isso nos mostrou quanto o nosso espaço e a nossa capacidade têm um potencial incrível na Europa. Em outubro, dia 22, vou receber uma diplomação na Aca- demia Francesa, em reconhecimento ao meu trabalho, que valoriza e tem foco no artesana- to. Um belo trabalho junto às comunidades que promove a sustentabilidade. Um trabalho social e econômico que ajuda as comunidades.

Nós transformamos o artesanato em um pro- duto de luxo, o que é muito complicado aqui no Brasil, pois as pessoas realmente não valorizam o trabalho manual, o artesanato. Aos poucos nós buscamos esse mercado internacional. De- vido à valorização lá fora, as pessoas conseguem engrandecer esse trabalho manual e absorvem todo esse processo, coisa que aqui no Brasil, in- felizmente, não acontece. Poucas pessoas têm essa percepção de como funciona toda a cadeia produtiva.

R.A – Na sua opinião, existe desvalorização ou algum tipo de preconceito no tocante ao pro- duto autoral?

IVANILDO NUNES: – Na verdade acredito que não é preconceito. Eu acho que não exis- te preconceito no mercado autoral. As pessoas conseguem absorver e consumir de uma forma tranquila esse mercado. O problema é que não querem pagar o valor justo por essas produções. Já é outro problema, consumir. Na verdade, eles buscam essa exclusividade, feita para a pessoa, sob medida, mas não querem pagar o valor que nos mantém. Como fortalecer uma marca, se ela é feita, no meu caso, artesanalmente, com uma produção lenta, dentro de um processo produti- vo onde tudo é feito à mão, que possa dar exclu- sividade ao meu cliente? Como sobreviver den- tro de uma realidade onde o meu consumidor não consegue entender esses processos? Por isso, nós buscamos outros mercados.

R.A – Que diferencial, critérios, você usa para criar suas peças?

IVANILDO NUNES: – Na verdade, o diferencial das minhas peças está no DNA, que é o artesanato, que é feito à mão, o exclusivo. Não compramos um tecido já construído com bor- dado, estampas e tal. A gente utiliza as rendas artesanais: a renda de bilros, o Richelieu, o crochê, o bordado entre outras, toda a referência e conceitos da alta costura francesa para fazer as peças. Impossível você encontrar uma peça igual a outra. Nesses doze anos de marca a gente nunca fez um vestido igual a o outro, todos os nossos vestidos são exclusivos, e isso traz respaldo pra marca.

 R.A – Você considera que atingiu o patamar desejado com suas criações autorais? Fale um pouco dessa ascensão.

IVANILDO NUNES: – A cada ano, a gente vem construindo nossa marca e com isso atin- gindo público, mas estamos longe do objetivo almejado, já que a marca tem um objetivo de atingir o mercado internacional, alavancar vendas e ter uma loja fora do Brasil, na Eu- ropa, pois buscamos mercados que valorizem nosso trabalho artesanal. A Europa possui essa cultura no tocante à valorização, porque é um mercado que já tem essa prática.

R.A – O trabalho autoral é uma lapidação to- tal de um produto bruto que se

transforma numa pedra preciosa. Trabalhar com peças autorais e elementos naturais é uma lapidação na sua opinião? Pode ser um grande diferencial para tornar o produto mais valorizado, além de agregar valor?

IVANILDO NUNES: – Nós realmente la- pidamos um produto bruto e fazemos essa transformação. Nós temos por aí centenas de artesanatos. Desde os primórdios, os índios já faziam artesanatos, depois os Portugueses trouxeram para o Brasil sua cultura e colo- caram dentro da nossa realidade os seus ele- mentos de construção artesanal e, até hoje, o Brasil é referência no mercado do artesanato.

“Com essa lapidação eu consigo imprimir um conceito de moda e design, transformando e devolvendo com um layout contemporâneo, isso é o que nós fazemos. Muitas vezes me cha- teio com a imprensa porque não conseguem absorver esse processo. Avaliam o meu desfile e acham que tudo que é mostrado na passare- la é industrial. A minha preocupação é essa: tirar o ranço do artesanato de feira. Eu uso o artesanato de uma maneira contemporânea, luxuosa, de forma que eu possa entregar ao meu consumidor, meu cliente, um produto de luxo. E para dar esse produto de luxo para o meu cliente, tenho que lapidá-lo .”

R.A – Você tem alguma novidade para nos contar?

IVANILDO NUNES: – Nós vamos estar com peças da marca na próxima novela das seis, Mar do Sertão, que vai estrear na Rede Globo. Nós vamos vestir a atriz principal com nosso vestido de noiva. Existe toda uma trama, um drama em cima de um vestido de noiva que envolve um casamento e a assinatura do vesti- do é nossa. É um vestido todo de renascença e Richelieu. Terá um segundo vestido também, e que ela não casa. (risos).

revista acontece – ago 2022 129

“Nós realmente lapidamos um produto bruto e fazemos essa transformação. Nós temos por aí centenas de artesanatos. Desde os primórdios, os índios já faziam artesanatos, depois os Portugueses trouxeram para o Brasil sua cultura

e colocaram dentro da nossa realidade os seus elementos de construção artesanal e, até hoje, o Brasil é referência no mercado

IVANILDO NUNES

do artesanato.”

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